QUANDO COMPRAR VIRA UMA DOENÇA



Caixas de sapatos novos, empilhadas. Roupas tomando quase todo o armário, muitas delas ainda com a etiqueta da loja. Prateleiras e mais prateleiras com produtos guardados, às vezes quase escondidos. Assim é a casa de um comprador compulsivo: pode até ser organizada, mas está cheia de coisas que ele não usa. Já sua vida financeira é o contrário: cheia de coisas que usa (cheque especial, inúmeros cartões de crédito), porém completamente desorganizada (os limites de crédito estão todos estourados).

Pessoas com esse perfil fazem parte de uma legião crescente, que ganhou até nome específico na ciência: oneomania. Embora os estudiosos tenham buscado uma palavra do grego antigo (one, que quer dizer compra) para batizar essa mania, trata-se de um problema bem moderno. Ganhou relevo nos últimos 20 anos, devido à maior oferta de crédito, à distribuição desenfreada de cartões, ao desenvolvimento de compras via telefone e, mais recentemente, via internet – quantos produtos estão só a alguns cliques do nosso alcance? E também devido à sucessão de lançamentos das mais variadas mercadorias, logo substituídas por outras.

Os compradores compulsivos são aqueles que têm dificuldade em avaliar a real necessidade de uma aquisição. "Compram para satisfazer um desejo ou para aliviar a ansiedade ou a depressão. Adquirem coisas que não usam, de vez em quando até duas vezes o mesmo artigo, porque não percebem que já tinham", explica a psicóloga Tatiana Filomensky, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, que presta atendimento gratuito aos portadores desse transtorno.

Para essas pessoas, levar um novo item para casa é uma espécie de bálsamo para os problemas, já que ativa o sistema de gratificação cerebral, responsável por liberar neurotransmissores que levam à sensação de felicidade. "Eles ficam dependentes desse sentimento", diz Tatiana. "Escondem que estão comprando. Vão às lojas no horário de almoço para ninguém da família desconfiar, mas se arrependem logo depois da aquisição”, completa.

Nos Estados Unidos, 6% dos consumidores são gastadores compulsivos, segundo uma pesquisa da Universidade Stanford. No Brasil, não há estatísticas sobre isso. O Instituto de Psiquiatria da USP atende 60 pessoas por ano, mas tem fila de espera. A maioria – quatro em cada cinco pacientes – é mulher. Os itens consumidos variam: bolsas, sapatos, acessórios e roupas para elas; e artigos para o carro, relógios e equipamentos eletrônicos para eles.
 

Diagnóstico e tratamento


Poucas pessoas que sofrem desse distúrbio conseguem perceber quando passaram do limite – é difícil para elas diagnosticarem que estão com um problema. “Consumir é uma ação muito comum no dia a dia, até incentivada. O indivíduo demora a perceber que tem algo a mais, que sua falta de controle é atípica, que não tem um desvio de caráter, mas uma doença”, afirma Tatiana.

Um dos sintomas é a impulsividade — não resistir a uma promoção, por exemplo, comprar algo sem pensar, mesmo que o dinheiro esteja curto e mesmo que saiba que nunca vai usar. Ou contrair dívidas atrás de dívidas, e continuar adquirindo itens supérfluos mesmo que a conta bancária já esteja estourada. Outro sinal de problemas é lançar-se a subterfúgios para gastar mais: ir às lojas escondido dos familiares e fornecer informações falsas para ter o crédito aprovado, por exemplo. Se perceber que você ou alguém de sua convivência está passando por problemas desse tipo, lembre-se que há tratamento.

No instituto da USP, os pacientes passam por uma avaliação psicológica para identificar se o impulso está ligado a problemas como ansiedade e depressão ou transtorno alimentar (peso excessivo ou bulimia). Depois, fazem terapia em grupo e são acompanhados por um psiquiatra, o que significa dizer que, às vezes, o tratamento tem de envolver remédios. Não que haja um comprimido que faça a pessoa parar de comprar; o medicamento é voltado aos sintomas que acompanham o distúrbio, como a depressão .



“A educação financeira também é importante, pois o endividamento é consequência inevitável da compulsão por compras”, destaca a assessora técnica da Diretoria Executiva do Procon-SP, Vera Lúcia Remedi. Percebendo o aumento desses casos, o órgão criou o Núcleo de Tratamento ao Superendividamento, que dá orientações sobre como quitar dívidas. Isso inclui, por exemplo, fazer uma lista discriminando os gastos fixos, de modo a identificar mais facilmente o que é supérfluo, e jamais pegar um empréstimo para pagar outro (leia outras dicas na matéria Como organizar seu orçamento doméstico).

Espero ter ajudado e que tenham gostado, beijoo da Rê.

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